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Lisboa, Lisboa, Portugal
Desoculto nocturno é abordagem de várias questões: Ora surgindo desnudado à luz do grande leão dos céus, ora sob o manto diáfono da noite, festejando a princesa das trevas, em peregrinações, onde o piar dos mochos e o grito das raposas, são as únicas vozes que quebram o silêncio milenar de canadas e penedias, nas quais ritos e mistérios ancestrais, ainda vagueiam à solta - Envergando várias túnicas, desdobrando-me em múltiplas personagens - Ou é privilégio do poeta dos heterónimos, que só discorreu à mesa dum café ou acastelado em sua“aldeia”?..Sei que posso correr o risco de não ser tomado a sério: mas que fazer? . - Dizia-se de Florbela Espanca, que os poetas e os profetas “usam disfarces que os tornam semelhantes a tudo o que os cerca”- Quando criei este site, foi apenas a pensar nos chamados fenómenos do mundo paranormal: relatos pessoais, consequência da minha adolescência, em sabates noturnos?!.. Ou fruto de solitárias e longas experiências marítimas em calmos e tempestuosos mares?!.. Estas as interrogações que pretendi aqui abordar. Afinal, cedo constatei ser-me difícil passar indiferente à análise e à reflexão, ocasionalmente, de outros fenómenos e temas da actualidade

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2010

ROSA LOBATO FARIA - OS POETAS PARTEM MAS NUNCA ENCERRAM A PORTA













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HOMENAGEM À ACTRIZ E À POETA

Olá, Rosa, é ainda Inverno!
Lá fora, a imensa abóbada
tolda-se de brumas, densas névoas!
Chove, o dia é cinzento e húmido,
há vento, o ar é gélido, faz frio!
Sim, dou-me conta de tudo isso!
E, até, já soube que abalaste
para outra vida, que já partiste!...

Porém, da janela velhinha
da casa onde eu nasci, descubro,
algures, em sítio indefinido
a tua distinta figura a passear-se
por um jardim florido e a sorrir
ao espaço aberto do mistério
e do céu que era único,
aos teus verdes olhos!
Era um espaço aberto,
um pedaço imenso,
era o céu, que era único,
um abraço imenso!
Maravilhoso, só teu!..

Vejo-o através das vidraças
enquanto ouço o chilrear dos pássaros
nos lindos versos que tu cantaste...
Mas, agora, esses teus belos versos,
soam tristes! - Porque, os sinos dobram!…
Tocam e dobram em tristes versos por ti!…

Sabes: Rosa Lobato Faria:
Mas a culpa é da saudade do velho campanário
da igreja da tua aldeia e não é minha,
porque, os poetas nunca morrem!
São de ontem, de agora e de sempre! - São eternos!
E, ao partirem, nunca encerram a porta!
Porque, atrás deles, outros os seguem!
Deixam sempre a porta escancarada,
deixam-na solitária e livre! - Fica
completamente franqueada!
Passam, partem! - São fugazes
e etéreos como é o próprio tempo..
Vão para longe e estão por perto..
Vão-se embora e logo voltam..
Estão connosco lado a lado,
E, mesmo que se ausentem,
estão sempre à nossa beira:
falam por eles os seus versos
que temos em nossa casa
na estante da biblioteca
ou à mesa da cabeceira.
E todos os dias - ó Rosa! - há novas alvoradas,
que esperam por nós e lufadas de ar fresco lá fora,
telas de manhãs cinzentas ou luminosas,
soalhentas ou diferentes, para abrirmos
devagarinho aquela velhinha janela
por onde te vimos, manhã cedinho, partir...

Jorge Trabulo Marques

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Rosa Lobato Faria

Se eu morrer de manhã
abre a janela devagar
e olha com rigor o dia que não tenho.

Não me lamentes. Eu não me entristeço:
ter tido a noite é mais do que mereço
se nem conheço a noite de que venho.

Deixa entrar pela casa um pouco de ar
e um pedaço de céu
- o único que sei.

Talvez um pássaro me estenda a asa
que não saber voar
foi sempre a minha lei.

Não busques o meu hálito no espelho.
Não chames o meu nome que eu não venho
e do mistério nada te direi.

Diz que não estou se alguém bater à porta.
Deixa que eu faça o meu papel de morta
pois não estar é da morte quanto sei.

Rosa Lobato Faria

(faleceu em 02-02-2010)

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